Entrevista com Amilcar Christófaro – Torture Squad, Matanza Ritual, Kisser Clan
Por Elias Scopel Liebl
Amilcar é um baterista brasileiro nascido em 1977 e que, desde 1993, faz parte da banda Torture Squad. Desde 2012, integra também o Kisser Clan e recentemente ingressou no Matanza Ritual. Já substituiu o baterista do Sepultura em várias ocasiões e participou em 2013 da comemoração dos 20 anos do Angra. Em 2016 tocou em Videira no El Compadre junto com a banda Ozzmosis, tributo ao Ozzy. E hoje é dia de bate-papo!
Na Mira do Rock (Elias Scopel Liebl): A primeira vez em que o encontrei pessoalmente foi quando tocamos no mesmo festival (Araraquara Rock), em São Paulo. Depois, nos encontramos em Videira, no El Compadre, onde fizemos um churrasco e batemos papo. Durante a pandemia trocamos algumas perguntas para o Jornal a Folha e fico feliz que novamente tenhamos a oportunidade de trocar algumas palavras. Nos conte como está sua agenda, hoje atuando em tantas bandas e projetos?
Amilcar: Fala Elias (Na Mira do Rock). Prazer falar contigo de novo. Ela tá muito corrida, ainda bem, a gente sempre busca por isso. Estou muito feliz com a agenda que está rolando, tanto do Torture que a gente lançou disco novo, Devilish. Temos lançado uns vídeos clipes de singles para divulgar o disco.
Vamos fazer um show na Horror Expo dia 05/11 aqui em São Paulo e o show de lançamento será no Summer Breeze em abril do ano que vem. O Matanza Ritual está em uma série de shows que vai culminar no dia 09/12, aqui em São Paulo no Matanza Fest.
Tive recentemente o PatFest, com o Kisser Clan, fui da banda base junto com o Andreas e o Yohan, um tributo muito honroso, a Pati (ex-esposa do Andreas) onde ele traz pra mesa uma conversa sobre a morte, ele doa toda a bilheteria para as ONGs que tratam sobre esse assunto, durante o evento vem pessoas de outras ongs com outros assuntos muito pertinentes, me sinto muito feliz em fazer parte.
Tivemos um ritmo de ensaio frenético para fazer o evento, fora a escola com as minhas aulas, ano que vem vai fazer 20 anos que dou aula no Bateras Beat Pinheiros. Muito feliz com a agenda corrida.
NMDR: Qual a diferença entre compor no Torture Squad e agora no Matanza Ritual? Há planos para novos discos?
Amilcar: A diferença entre compor com o Torture e com o Matanza é grande, na verdade o que é grande a diferença, é que no Torture eu sou um dos principais compositores, no Matanza os principais ali por enquanto está sendo são o Antonio e o Jimmy, eu e o Felipe vem pra dar um acabamento na música, na grande maioria das vezes vem 80% pronta e quando a gente se encontra dá uma afinada em alguma coisa. Já no Torture, eu como nesses 30 anos que banda ta fazendo esse ano, tenho o costume de compor uma música inteira ou a gente, no estúdio, compor rifles para ir montando uma música, então eu sou muito mais inserido, no sentido de estar mais dentro das ideias da música. No Matanza, como eu disse, a música vem quase pronta e eu dou um acabamento na bateria.
NMDR: Como é dividir o palco com grandes nomes da música pesada brasileira? Chega a ser um sonho que tornou-se realidade?
Amilcar: Com certeza é um sonho que se torna realidade, eu digo principalmente, quando eu ia imaginar que um dos grandes heróis da vida que, por exemplo, é o Andreas junto com o Sepultura, que pra mim foi um divisor de águas, foram os brasileiros que me mostraram que se você acreditar na música, se você acreditar em você, você pode conquistar o que quiser, essa a mensagem que me passaram. Quando que eu ia imaginar que um dia estaria ali, ele me chamaria pra ser baterista do Kisser clan, a banda que ele teria com o filho dele, Yohan. É realmente um sonho que se torna realidade, sem sombra de dúvidas, é um prazer dividir o palco com grandes músicos que nem o Jimmy, o Felipe, o Antonio.
No caso do Torture, o Castor que se tornou meu grande irmão de vida, de cozinha, de baixo e batera, e todo mundo que tocou no Torture, me sinto tão privilegiado de tocar com grandes músicos, o Cristiano Fusco, primeiro guitarra do torture, pra mim é um dos maiores rifle makers do país. Todos os guitarristas que passaram, todo mundo da banda, todos grandes músicos. Me sinto muito privilegiado de poder ter tocado, composto com eles músicas e ter dividido palco.
NMDR: Percebi que durante o tempo em que ficamos um pouco mais isolados na pandemia, muitas pessoas se distanciaram por várias questões, mas muitas se atraíram, grandes músicos gravando juntos, fazendo jams sessions, lives, etc e por essa perspectiva isso foi muito legal. Como está sendo pegar a estrada novamente, existe algo que mudou pós pandemia pra você?
Amilcar: Olha Elias, pra mim essa volta da pandemia agora, pegando estrada agora, voltando a tocar, voltando a ter contato com as pessoas, eu acho que tenho curtido mais todas as situações que tô, seja tocando, ensaiando, conversando com alguém. Seja em qualquer lugar, principalmente estando com minha namorada, fazendo o que quer seja, em todas as situações. Tenho gostado muito de estar ali fazendo aquilo. Quando uma pessoa vem conversar comigo sobre um trabalho, sobre um disco, um filme, ou na escola quando tô dando aula, quando tô só na recepção falando com as pessoas sobre música. Acho que a pandemia ela destacou isso mais, eu já gostava mas eu acho que a pandemia destacou mais.
Realmente no meio da pandemia, se fez muitas lives, eu mesmo fiz no canal do Torture, em 2021, o The Unholy Spell, nosso terceiro disco fez 20 anos e eu fiz uma série de lives no Instagram da banda, conversando com as pessoas que foram envolvidas no disco, o produtor, quem fez a capa, todos os músicos. Então, a gente busca esse contato humano, acho que uma das melhores coisas da vida é ter esse contato humano, essa sinergia quando você tá tocando, a música com o público, e depois quando você tá conversando com as pessoas sobre qualquer assunto, essa troca de informações, esse bom bate-papo. Isso se destacou nesse pós-pandemia.
NMDR: Tocar com Andreas Kisser, Jimmy London, Felipe Andreoli deve ser muito louco. Existe algum músico em específico que você ainda sonha em compartilhar o mesmo palco, ou quem sabe trabalhar junto?
Amilcar: É bem difícil essa pergunta, eu acho que todos os nossos heróis, ia ser muito foda fazer um som. Eu sempre sinto quando eu to fazendo alguma coisa junto com eles, vai desde Chuck Billy que fez com a gente no Testament, no rock in rio, passando pelo Marcão do Claustrofobia, que é um amigo das antigas e tenho um carinho enorme e a gente fazer um som juntos, passando até pelo PatFest agora, junto com o Andreas fazendo um Rolling Stones com Dinho Ouro Preto do Capital Inicial. Nunca fui um super fã do Capital Inicial, mas estando ali com um cara que faz parte do rock brasileiro é bacana. Então tem muitos músicos. Com o Luis Carlini, fiz um ensaio tocando “Agora só falta você” da Rita Lee, é muito interessante, muito especial, eu me sinto em um momento especial e eu vivo isso, gosto muito desses momentos.
Claro, como eu disse, todos os nossos heróis eu acho que seria especial fazer um som e tocar junto. Por exemplo, o James Hetfield, sem sombra de dúvidas, o King Diamond seria um cara muito foda, eu gostaria muito de fazer um som com o Chris DeGarmo, ex-guitarrista do Queensrÿche, cara que eu realmente amo artisticamente, o David Gilmour do Hard Heavy, o próprio David Gilmour do Pink Floy, o David Vincent do Morbid Angel. Fora os outros que já fiz um som, como o Alex do Krisiun, o Moyses do Krisiun e tantos outros. Acho que consegui responder mais ou menos a pergunta.
NMDR: Conte algum acontecimento de bastidor que ficou marcado em sua memória durante turnês com o Torture Squad, Matanza Ritual e Kisser Clan…
Amilcar: Muita coisa, com o Torture uma que aconteceu que vai ficar eternamente no meu coração sem sombra de dúvidas. Em 2009, a gente estava fazendo, o que considero a maior turnê, a mais especial que a gente já fez, que foi a turnê europeia com a Overkill, Exodus e Gama Bomb, as quatro bandas. No dia 23 de fevereiro, a gente tava fazendo show em Aschafemburgo, cidade no sul da Alemanha, onde a gente morou por 2 anos, porque nosso Manager na época morava lá, a gente tinha assinado com a Awaken Records, nosso QG tava nesta cidade na Alemanha.
Nesse momento morando lá, a gente ia muito em uma casa de show chamada Colossal e eu assisti Death Angel e Jon Oliva ‘s Pain. A gente assistiu muito show lá, a gente sonhava em tocar lá, e esse dia chegou e foi um dia muito especial que foi nessa turnê, no dia do meu aniversário, incrível isso. A turnê estava começando, tinha começado dia 20 em Londres e no dia 23 a gente tava em Aschafemburgo na Alemanha. Foi nesse dia que realmente quebrou o gelo em todas as bandas, a Overkill estava com o ônibus dele, o Exodus com o ônibus dele, a gente estava no motorhome e o Gama Bomb estava no motorhome deles. No dia 23, terceiro dia, foi o dia que as bandas se conheceram mais, a partir dali todo mundo ficou amigo na estrada e o que permaneceu até o final da turnê.
Eu lembro que o nosso show tava aguardado porque todo mundo conhecia a gente ali na cidade, o Gama Bomb tocou, a gente tocou em segundo, e quando a gente tocou foi muito legal a receptividade, foi um puta show energético, e todo mundo sabia que era meu aniversário. Quando sai do palco eu olhei pro lado esquerdo e eu vi um cara falando pra mim “Happy Birthday man” e ai quando olhei pra esquerda, eu só vi uma Flying V branca com uma mão tocando sem som, a pessoa tava no escuro, quando ela deu dois passos pra frente, era o Gary Holt me dando os parabéns, para mim foi muito inesquecível, muito especial esse dia, por tudo isso.
Com o Matanza Ritual, posso citar um momento não tão bacana, foi um show em Aracaju a pouco tempo, a intro do show tava rolando, eu tava pra entrar no local do show e eu torci o pé, tava indo do camarim pro local, estava tudo muito escuro e quando abriu a porta eu pisei para dentro achando que era o mesmo nível de chão, e tinha um declive, não vi e meu pé direito torceu, torceu muito e todo o peso do corpo foi pro calcanhar torcido. Fui pro palco mancando muito, quando coloquei o pé no pedal do bumbo eu não conseguia nem tocar direito. O show do Matanza Ritual, a gente vai fazendo blocos, emenda cinco músicas, depois pausa e emenda mais. Não dava pra tocar uma e parar pra ver o que aconteceu, tive que tocar cinco músicas sentindo grande dor, eu sentia que meu tornozelo tinha inchado muito. De uma música pra outra consegui falar com o Doug que trabalha comigo pra pegar uma sacola de gelo, e quando acabou a primeira leva de músicas eu joguei gelo na minha meia, por dentro, pra ficar gelo no pé. Fui tocando o show um pouquinho com o pé direito, mas 90% com o pé esquerdo, uso pedal duplo, então o estudo do pé esquerdo fez diferença. Toquei o show inteiro com o pé esquerdo, saí do palco mancando muito. Quando cheguei no camarim e mostrei, estava quase um pescoço o meu tornozelo. Passei gelol, tomei anti inflamatório e ainda tinha mais dois shows pela frente. Meu corpo foi melhorando, fiquei até surpreso, no show do dia seguinte já comecei a tocar uns 40% com o pé direito e no outro show eu já tava uns 80% com o pé direito. Foi saindo o roxo que ficou e a “bolota” foi diminuindo. Uma lembrança não muito boa, mas fiquei feliz que consegui cumprir com o show.
No Kisser Clan, eu lembro de um momento muito legal. Em 2017, o Kisser fez o Rock District do Rock in Rio, e eu lembro que a gente fez o show e o Yohan me apresentou no meio do show, o pessoal começou a gritar “Torture Squad”, e foi um puta show. Quando a gente saiu do palco, o Andreas veio olhar pra mim, a gente se deu a mão e ele falou: “No próximo Rock in Rio o Torture tem que tá, tem que ter Torture Squad no Rock in Rio”. E eu falei, que seria um sonho, e esse sonho se tornou realidade, graças ao Andreas. Em 2018, outubro de 2018, exatamente um ano antes do show do Rock in Rio 2019, ele me ligou falando que tinha um espaço, que o Zé Ricardo, curador do palco Sunset, tinha dado pra ele, e ele tinha pensando na gente, no Claustrofobia e mais um convidado, pediu se a gente aceitaria, e a gente com certeza. Falou que um dos convidados poderia ser o Chuck Billy. A gente comentou que de ser o Chuck Billy, sendo uma das grandes referências pra gente junto com o Testament. E acabou sendo, aí em 2017, o Andreas me fala aquilo e se trabalha pra que role e se tornou. Ele foi muito parte disso, em 2019 o Torture estava lá com o Claustrofobia e o Chuck Billy tocando no Rock in Rio. Foram momentos especiais.
NMDR: As possibilidades para compor dentro da música são infinitas, e o metal/rock também detém estas possibilidades. Como você enxerga a cena metal atual e qual sua postura dentro do estilo, segue a linha mais tradicional ou consegue se abrir para novas possibilidades e tendências que extrapolam um pouco a linguagem clássica do metal/rock?
Amilcar: No campo da composição, eu acho que a pessoa ela tem que ser verdadeira com o que ela ta sentindo, seja ela compor um estilo só ou compor um estilo que traga um traço de pluralidade, ou seja, tem um embrião, mas ela se abre para outras inspirações. Falo nem de estilos musicais mas acho que toda forma de arte inspira um músico a compor.
Eu enxergo a cena metal brasileira hoje com mais abrangência, com certeza, eu venho do começo da década de 90, vejo muito as bandas que fazem um som que fica dentro do mesmo estilo, outras que mudam completamente sendo influenciadas por bandas que estão em evidência, isso desde a época de Sepultura, Krisiun, Angra. Vejo várias coisas, vejo as bandas que continuam compondo no mesmo estilo, bandas que mudam completamente o estilo, sentindo inspiração e referência de banda de destaque no momento. Eu me encaixo na parcela onde você tem um estilo, um embrião, mas está aberto a ter influência do que você naturalmente sente que é legal pra você.
O Torture quase sempre foi dessa forma, sempre teve nosso embrião, mas sempre aberto a sentir aquilo que sentimos bem para compor de forma natural, se eu me inspiro por outro estilo de música, fatalmente eu vou tentar colocar no meu estilo de Death Thrash do Torture, trazer aquilo com uma roupagem dentro de nossa característica, sem mudar por completo nossa característica. A gente sempre foi dessa forma e eu gosto de ser assim, até hoje é dessa forma. Agora a cena nacional vejo de diversas formas, bandas que continuam fazendo o mesmo estilo, bandas que mudam por completo, bandas com seu estilo mas que incorporam coisas pro seu estilo. A cena está muito rica hoje.
NMDR: Quais os planos para o futuro próximo do Amilcar como pessoa e como músico?
Amilcar: Os meus planos pro futuro casam muito com o que tá acontecendo no presente, faz muito parte do lançamento do disco novo do Torture, fazer ano que vem turnês fora do país, principalmente na Europa e América Latina, fazer turnê brasileira para divulgar o Devilish ao máximo.
O Matanza Ritual também continua, a gente tem muita música, tem música para um disco, mas a intenção do matanza, por enquanto é lançar singles com videoclipes e tudo, mas pode ser que no próximo ano, pode acontecer de vir um disco, isso dependa da estratégia de carreira da banda. Kisser Clan depende muito da agenda do Andreas com o Sepultura, quando bate as agendas a gente sempre faz uma coisa, sempre uma festa, muito gostoso tocar com o Kisser Clan, como nas próprias palavras do Andreas: “uma festa do heavy metal”, é muito legal.
A minha vida na escola, no Bateras Beat Pinheiros, continua firme e forte, estamos crescendo na escola com mais salas. Convido a todos pra quem quiser ter uma aula pra conhecer o instrumento que tanto quer tocar ou quer aperfeiçoar, faça uma visita pra gente aqui na João Moura, 993, no bairro Pinheiros em São Paulo, estão mais que convidados! Estou aqui a todo vapor trabalhando para os eventos da escola, trabalhando para os alunos.
NMDR: Obrigado pelo bate-papo e por toda a dedicação pelo metal nacional. Isso é muito importante para nós, amantes da boa e pesada música. O espaço final é seu.
Amilcar: Obrigado Elias, Na Mira do Rock! Valeu sempre pelo interesse em conversar e a gente poder divulgar um pouco do trabalho com as bandas e com a escola. Parabéns a você também por manter o veículo e trazer informações para os headbangers brasileiros. Grande abraço à todos e espero encontrar todos pela estrada.
Elias Scopel Liebl – Engenheiro agrônomo e apaixonado por boa música, Rock ‘n’ Roll!